Valdiocir Bolzan

O João do Padre
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Quando o Padre Mário Deluy veio para São Sepé em 1903, trouxe consigo um filho de criação chamado João Nogueira. Naquele tempo ele era bem jovem, demonstrando ter uma aprimorada educação do mestre que, provavelmente era ministrada pelo seu boníssimo pai adotivo. Aqui chegando, procurou se relacionar com aqueles rapazes da sua idade, tornando-se logo bem popular entre eles.

Com o seu modo de proceder com as pessoas e a sua conduta na sociedade que o acolheu de braços abertos, o João sabia acautelar-se quando julgava que poderia ser envolvido em qualquer coisa que pudesse refletir na sua reputação. Ele era benquisto por todos que o cercavam, motivo pelo qual causava grande satisfação àquele sacerdote.

Para diferenciar dos vários “Joãos” que existiam em São Sepé, foi apelidado de João do Padre, alcunha que ele aceitou de bom grado. Tomava parte em todas as diversões locais, principalmente dos bailes que gostava muito. Tendo acentuada vocação para música, procurou o Cantídio Pontes que naquela época era o mestre dessa arte em São Sepé.

Em pouco tempo adquiriu conhecimentos musicais, se tornando um ótimo amador tocando flauta e violão. Como tinha boa voz, dedicou-se também à modinhas e foi logo atraído para a serenata e por esse meio enamorou-se de uma bela moça chamada Maria das Mercês e, em pouco tempo, pediu-a em casamento, tendo total apoio dos familiares da moça.

Na véspera do seu casamento, como despedida de seu esporte predileto, a caça, saiu com sua arma a tiracolo levando como companheiro um gurizinho da casa, chamado Nestor, que também era criação do vigário. Seguiram em direção ao Alto do Posto com a finalidade de abater algumas perdizes. Quando lá chegaram, o João, um pouco cansado daquela caminhada, trepou em uma cerca, encostando-se nela para descansar. A seguir, o seu companheiro seguiu adiante com a intensão de abater umas perdizes que estavam próximas e farejadas pelo seu cão perdigueiro.

Passados alguns minutos o guri ouviu um tiro e, cheio de satisfação, julgando que o companheiro João havia abatido uma perdiz, voltou ao ponto de partida.

Para sua surpresa encontrou o João caído ao solo, com a cabeça lavada de sangue, tendo uma perna presa no arame da cerca, falecendo em seguida por motivo de disparo involuntário de sua própria arma. A seguir foi arrebatado pelos braços de seus amigos e recebeu carícias da sua desventurada noiva ao cair daquela tarde fatídica. Na época, o jornal O Sepé, edição de 8 de junho de 1910, publicou com profundo pesar a triste notícia da morte do inditoso moço João Nogueira.

O Padre Mário Deluy sofreu imensamente com o desaparecimento desse filho a quem depositava toda confiança e que um dia seria o seu amparo na velhice. Quando ele falava no “meu João” era com os olhos rasos de lágrimas. Aumentava mais o seu sofrimento moral quando via uma orquestra em ocasiões de reuniões familiares e quando aqueles antigos companheiros de seu filho, altas horas da noite, andarem em serenatas e principalmente quando passavam perto da casa paroquial. Tudo isso era motivo de triste recordação do seu estimado filho João.

 

NOTA DO COLUNISTA

O Padre Mário Deluy veio de Vacaria para São Sepé na data citada nesta coluna e quando andava em um cavalo no sentido Cachoeira do Sul/São Sepé e na proximidade da divisa dessas duas localidades, encontrou um senhor a cavalo tocando um tambor e solicitando donativos para a Festa do Divino Espírito Santo e, ao falar com o referido padre, disse que em São Sepé não tinha padre, ouvindo do sacerdote o seguinte: “Não tinha até o presente momento. Estou indo a São Sepé assumir a paróquia”.

 


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