Boate Kiss: Comandante dos Bombeiros foi o último a depor em Santa Maria

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O Tenente-Coronel Luiz Marcelo Maya, Comandante do 4º Comando Regional de Bombeiros foi o último a depor na tarde da ultima sexta-feira, em Santa Maria. O militar contou que chegou na cidade de Santa Maria no dia 28/03/13, dois meses após o incêndio na boate. Antes, atuava em Santa Cruz do Sul. “Encontramos dois mil pedidos de vistoria. Na época, entravam 450 novos pedidos por mês. Fizemos uma força-tarefa. Em dois meses conseguimos resolver demandas reprimidas, não só de prevenção contra incêndio”.

Disse que, até agosto de 2012, o alvará da Kiss estava válido.

Informou que não conhece nenhum fato que desabone a conduta do seu antecessor, Tenente-Coronel Moisés Fuchs, nem do Major Gerson da Rosa Pereira, nem do Capitão Alex da Rocha Camilo.

Sobre o fato do prédio onde funcionava a boate Kiss ter apenas uma porta, o Oficial explicou que a exigência varia, conforme o tamanho e a dimensão da porta. “Para afirmar algo específico, eu teria que entrar na boate e fazer a vistoria”.

boate kiss

Completou informando que, na terceira visita dos Bombeiros, se busca a mesma fotografia do início e se os sistemas todos estão funcionando. “Se o proprietário alterasse o espaço, teria que ter um novo projeto apontando as modificações e apresentar para os bombeiros. Depois disso, teria que agendar nova vistoria. O proprietário, quando protocola esse pedido, deve apontar que houve alterações, para que o CB saiba que deve priorizar essa vistoria”.

O Defensor destacou que há informações de testemunhas que apontam que uma certa quantidade de espuma já existia no prédio antes de Elissandro assumir a boate. O militar respondeu que, com a Lei Kiss, os bombeiros exigem um laudo atestando que a espuma não é tóxica. Na época, não havia orientação quanto a isso.

Ainda sobre a Lei Kiss, o advogado de Elissandro mencionou a criação de órgãos técnicos para avaliação de projetos. Perguntou qual a formação específica. A testemunha respondeu que é através de formação curricular no curso para Oficial do Corpo de Bombeiros ou no curso de formação de soldado. O curso dura de seis a nove meses e 1/3 é dedicado a cadeiras específicas. A tarefa de prevenção contra incêndio é atribuída aos bombeiros. Mas também há cursos de treinamento em áreas específicas ministradas por Oficiais com curso de especialização.

A presença de apenas uma porta no local também foi tema de questionamento. O Advogado ressaltou o parecer do Major Gerson da Rosa Pereira, que apontou que a porta da Kiss estava de acordo, conforme seu tamanho e dimensões. Já no inquérito, a Polícia sustenta que foi um erro dos Bombeiros não exigir mais uma alternativa de saída. “Só poderia responder se fosse no local fazer vistoria. Há informações de que havia duas portas uma do lado da outra. Tem que ser levada em consideração a distância a ser percorrida, entre outros itens”.

Esclareceu que, se o bombeiro constatar uma irregularidade que enseje uma interdição, ele pode fazer isso. “A legislação anterior não é tão clara quanto a essa questão”, frisou.

A falta de um PPCI válido não era motivo para interdição naquela época, afirmou.

Sobre a atuação dos membros da corporação no dia do incêndio, o Tenente Coronel Maya informou que, inicialmente, 11 bombeiros atenderam a ocorrência. Seis deles estavam na fase final do curso de formação. E disse que, “certamente a guarnição teria equipamentos disponíveis para todos no quartel”.

“Quem faz o isolamento não deve permitir que civis adentrem no local, esses 11 bombeiros não vão se preocupar em afastar civis, mas em atender os que estão lá dentro. Civis podem manusear a mangueira, mas não na área quente”, afirmou.

Segundo o Coronel Maya, no ano passado, o orçamento do Fundo de Reequipamento dos Bombeiros (FUNREBOM) foi de R$ 600 mil. A arrecadação anual foi de R$ 400 mil. “Não é a única fonte do Corpo de Bombeiros. É um recurso complementar”.

“Quando cheguei no dia 28/03/13, a dotação estava razoável, até melhor do que em outros locais. Mas pode melhorar”.

O depoimento do Comandante durou 1h30min.

Ao final da audiência, o Juiz Ulysses Fonseca Louzada marcou a oitiva do delegado Sandro Mainers para o próximo dia 23/04, às 13h30min.

 


Delegado Marcelo Mendes Arigony prestou depoimento

O Delegado Regional de Santa Maria Marcelo Mendes Arigony também depôs em Santa Maria. A audiência integra o processo que investiga o incêndio na boate Kiss, ocorrido em 27/01/13. O depoimento durou quatro horas.

Arigony foi arrolado pela defesa de Elissandro Callegaro Spohr. Em seu depoimento, o Delegado ratificou as conclusões da Polícia Civil no inquérito policial que indiciou por homicídio doloso (quando se assume o risco de matar) os empresários Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Londero Hoffmann e os músicos da Banda Gurizada Fandangueira Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos.

O Policial Civil contou que chegou ao local do incêndio por volta das 5h de domingo. Tinha muita fumaça densa. Não conhecia a boate. Disse que viu primeiro os corpos que estavam no banheiro. “O papel da Polícia Civil, naquele momento, era de coadjuvante”, disse. Informou que, de imediato, não conseguiu entrar, porque, segundo um bombeiro, havia risco de desabamento da estrutura. Adentrou cerca de 30 minutos depois.

 


Deputado Estadual Adão Villaverde também depôs

Autor da chamada “Lei Kiss”, o Deputado Estadual Adão Villaverde depôs, sexta-feira, em Santa Maria. O depoimento estava previsto para as 13h30min, mas começou com 1h30min de atraso, já que a audiência com o Delegado Marcelo Arigony se estendeu por quase quatro horas. A oitiva se encerrou às 17h.

A presença do parlamentar foi requisitada pela defesa de Elissandro Spohr. O objetivo era de que a testemunha discorresse sobre a elaboração da Lei Kiss (Lei Complementar nº 14.376/13), que estabelece regras de segurança e prevenção contra incêndio no Estado.

O Deputado fez uma série de comparações, do ponto de vista técnico, entre a lei que regia a matéria e a nova legislação. A legislação anterior não tem o rigor e a clareza que a atual possui, afirmou.

Entre as mudanças trazidas pela Lei Kiss, foi ressaltada a possibilidade de o Corpo de Bombeiro ter profissionais civis de Engenharia e Arquitetura contratados atuarem na análise de projetos. Outra mudança citada é a validade do Alvará de Prevenção e Proteção contra Incêndio (APPCI), que passará de anual para três anos, para as edificações. E também o maior rigor quanto à lotação dos estabelecimentos.

A lei anterior não detalhava quanto à realização de shows pirotécnicos em estabelecimentos. Pela nova norma, o proprietário não pode fazer sem autorização.

Sobre a tragédia ocorrida em 27/01/13, o Deputado afirmou que “um conjunto de condutas de risco na boate Kiss foi determinante para a tragédia”, como a obstrução de rota de fuga, a lotação acima do permitido e o uso de artefato pirotécnico, mas evitou apontar culpados. “Nada vai reparar essa tragédia, não queremos que isso se repita. Houve responsáveis e eles não podem sair impunes. Isso não é um juízo final. Quero chegar a uma responsabilização, juntamente com os familiares das vítimas e a sociedade. Se eu tivesse um juízo sobre o processo não estava depondo aqui”, disse.

Indagado sobre uma possível responsabilidade do Poder Público, Villaverde não descartou: “Sempre que não há fiscalização adequada, colabora para uma tragédia. Em algum grau a fiscalização contribuiu para o que aconteceu. A nova legislação atribuiu as responsabilidades ao proprietário/usuário do local, ao Poder Público Municipal e aos Bombeiros. Mas também afirmou que a falta de fiscalização não isenta o proprietário das suas obrigações. O proprietário sempre é co-responsável”.

Frisou que não concorda com as alterações que a lei sofreu; na sua avaliação, flexibiliza a questão, especialmente no que se refere à ampliação de 750 para 1,5 mil metros quadrados da área mínima para uso do PPCI simplificado.

Disse que houve pressão de empresários de diversos setores para que a lei fosse alterada, com vistas aos interesses econômicos.

Adão Villaverde é Engenheiro Civil e ex-conselheiro do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio Grande do Sul (CREA/RS).

Ele apontou algumas irregularidades na boate Kiss, como o fato de ter apenas uma porta. Para funcionar, o Alvará de Proteção contra Incêndio deveria estar em dia. Edificação em obras não pode obter licença para funcionar.

“Entendo que, nas condições em que estava, com todas essas situações de risco, essa boate não poderia estar funcionando”, falou.

 

 

* TJRS / Janine Souza