Caso Bernardo: pai foi o primeiro réu a prestar depoimento

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Foto: arquivo/reprodução/TJRS

 

Foto: reprodução/TJRS

O médico Leandro Boldrini foi o primeiro dos quatro réus a ser interrogado no terceiro dia de julgamento do Caso Bernardo nesta quarta-feira, 13. O pai de Bernardo é acusado de homicídio quadruplamente qualificado (motivo torpe, motivo fútil, emprego de veneno e dissimulação), ocultação de cadáver e falsidade ideológica.

O médico falou o tempo todo voltado para os jurados. Reconheceu que era um pai ausente, por conta do exercício profissional, disse que queria que os dois – Bernardo e Graciele – se acertassem e admitiu que hoje se arrepende, que poderia ter diminuído o ritmo de trabalho para ficar mais com o filho.

“Quando me tirarem essas algemas vou em Santa Maria rezar e me ajoelhar aonde está sepultado o meu filho. Minha vida está um livro com duas páginas em branco. Não consegui iniciar nem terminar um luto. Estou soterrado naquela cadeia”, afirmou o médico, citando também o desejo de abraçar a filha. “Foi a Graciele e a foi a Edelvania. E onde eu me encaixo nisso? Em lugar nenhum”, disse. “Foram elas”, frisou o réu.

Leandro Boldrini declarou que pretende retomar a vida na cidade de Três Passos. “Aqui me criei como médico e aqui vou continuar. O que fizeram com Bernardo não tem explicação. A vida, a gente reconstroi depois. O caminho vai ser trilhado de volta aqui em Três Passos. Porque eu não mandei matar meu filho.”

 

Denúncia

De acordo com a denúncia do Ministério Público, o réu é o mentor intelectual do crime e incentivador da atuação de Graciele em todas as etapas, inclusive no que diz respeito à arregimentação dos colaboradores, Edelvânia e Evandro Wirganovicz. Leandro teria patrocinado despesas e recompensas e também fornecido meios para acesso à droga Midazolan, utilizada para matar o menino. Para o MP, Boldrini e Graciele não queriam partilhar a herança de Odilaine com Bernardo, que representava um estorvo para a nova unidade familiar, formada pelo médico, a madrasta e a filha do casal, Maria Valentina.

 

Pai provedor

“Ainda amo o meu filho como sempre”, disse o réu logo no início do interrogatório. Ele concordou com as afirmações das testemunhas que disseram que ele era um pai ausente. “Concordo. Fui um pai mais provedor do que presente.”

Contou, nominando amigos do filho, que “Bernardo decidia a agenda dele, por isso só eles ia na casa dos amigos, e não o contrário”.

O médico ressaltou que procurava estar próximo com Bernardo nos finais de semana, em atividades que envolviam também a madrasta e a filha do casal. E que fazia curso de inglês com o filho. E que havia a determinação de o menino voltar para casa às 19h.

Sobre o episódio da primeira Comunhão, Leandro disse que foi com Bernardo fazer a inscrição para a catequese, mas que o menino não era muito assíduo. Afirmou que precisou viajar (foi a um casamento), que pediu a uma amiga acompanhar o filho e que tem certeza que deixou roupa para o filho usar no dia da cerimônia. “Ele tinha orientação de que fossem o acompanhar e tinha roupa.”

Bernardo tinha uma personalidade forte e determinada. E as explosões de raiva foram ficando cada vez mais crescentes.

Não entregou o menino para a avó porque “tinha certeza de que a coisa ia melhorar”.

 

Desaparecimento

Leandro declarou que, no dia em que o menino sumiu (4/4/14), a família almoçou junto e o clima era muito bom. “Pensei que estavam se acertando depois da audiência.” A madrasta disse que levou Bernardo com ela para Frederico Westphalen para que o enteado não ficasse em casa, sob risco de atrapalhar o sono da filha caçula.

Durante o desaparecimento de Bernardo, Graciele continuava normal, “como água cristalina”. “Ela disse que estava dando banho na Maria e que o Bernardo entrou no quarto, pegou as roupas e disse que ia para o Lucas (amigo).” Em nenhum momento Leandro desconfiou de Keli (apelido de Graciele).

“Na medida em que os dias iam passando, ia apertando o coração.” No domingo seguinte, a Delegada Cristiane Moura disse que a Polícia havia descartado as outras duas linhas de investigação (fuga e sequestro) e que acreditava em homicídio. Você se apavora, mas não acredita. O médico foi para casa e contou o que a Delegada disse.

No dia 14 de abril de 2014, Leandro soube pela Polícia que Bernardo estava morto. “Fui algemado sem saber o motivo. A Delegada respondeu que foi porque eu matei meu filho. Ela me pedia para dizer onde estava o corpo.”

Quando encontrou Graciele, Leandro disse que ela chorava e admitiu que cometeu o crime. “Precisei ser segurado.”

 

Audiência

Quando Bernardo procurou a Justiça para reclamar das condições em que vivia em casa, Leandro considera que foi um desgosto para Graciele. Sobre a conversa com o Juiz Fernando Vieira dos Santos, titular do Juizado da Infância e Juventude de Três Passos, em 11 de fevereiro de Bernardo 2014, Leandro contou que a ideia de dar um aquário surgiu ali. Disse que também foi conversar com o coordenador da escola, que revelou a desatenção de Bernardo na escola.

Afirmou que conversou com os dois: “Fiquei confiante que a coisa ia engrenar.”

 

Uso de medicamentos

Leandro enfatizou que o uso de medicação de uso controlado e contínuo ajudou Bernardo a ficar mais calmo. Afirmou que Bernardo tomava Ritalina (para controlar o Transtorno de Deficit de Atenção) e Depakote ( um estabilizador cerebral), duas vezes dia cada um, com prescrição de psiquiatra. Na opinião dele, todos necessários para a melhora do menino.

 

Midazolan

Midazolan é um medicamento de uso controlado que o médico Leandro Boldrini utilizava para fazer endoscopia em seus pacientes. A reposição das ampolas era feita conforme o uso. “A Keli tinha acesso.” Ele não sabia que uma funcionária tinha dado falta de certa quantia da medicação

Disse que deixava o bloco de receituário em que a secretária tinha acesso, mas Graciele também. E garantiu que a assinatura na receita usada para comprar o Midazolan ministrado em Bernardo não é dele.

 

Relacionamento com a madrasta

“Graciele e Bernardo se odiavam. Mas jamais pensei que fosse fazer isso”, admitiu Leandro. O pai de Bernardo afirmou que tudo o que queria, era que os dois se dessem bem. “Eu dizia pra ela: Graciele, o Bernardo vai crescer.” O menino estava começando a ficar mais autônomo, decidindo o que queria fazer. “Bernardo era um integrante da família. Não era um estorvo.”

 

Vídeos

Leandro tentou explicar as circunstâncias dos vídeos gravados por ele do próprio celular. O em que Bernardo aparece ameaçando o pai com um facão, o médico disse que foi uma explosão de raiva do menino porque não queria ir para a casa de Juçara Petry, a tia Jú, mas ela não poderia ficar com ele naquele dia. Afirmou que a ideia de gravar foi de Graciele. “Minha intenção era mostrar para o Psiquiatra.”

No vídeo em que Bernardo grita por socorro, o médico conta que o filho estava em uma sala. Só havia a família na casa. Leandro saiu do quarto para atender a Brigada Militar.

Nesta quinta-feira, 14, o júri prossegue, com os depoimentos dos demais réus – Graciele Ugulini, Edelvânia e Evandro Wirganovicz.

 

 

Fonte: TJRS