Valdiocir Bolzan

Esculápios de outros tempos em São Sepé
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O texto abaixo foi enviado por Valdiocir Bolzan e publicado na íntegra como consta nos manuscritos de Diolofau Brum, o “Seu Faim”. O texto é de inteira responsabilidade do colunista. O portal “O Sepeense.com” optou por preservar os nomes dos envolvidos, colocando o sinal de asterisco no local dos nomes (***). A grafia utilizada na época foi preservada.

 

Antigamente quando nem se sonhava com regulamento das profissões liberais no Rio Grande do Sul, São Sepé era um verdadeiro viveiro dos chamados “charlatões” de todo gênero, notadamente da medicina. É de se acreditar que, no Estado era o lugar que houve o maior número de aventureiros que, ilegalmente, exerciam essa delicada profissão. Qualquer desconhecido que aportava aqui, dizendo que era médico, sem mesmo apresentar credenciais,no dia seguinte ao de sua chegada, abria o seu consultório e, a influência de clientes ali, era de espantar. Certa vez apareceu um desses exploradores da arte de curar, chamado *** e, mais tarde, outro que atendia pelo grotesco nome de “***”. Esses dois esculápeos, ladinos (espertos) como eram, fizeram sucesso naqueles velhos tempos em São Sepé.

Chegou também aqui um que residiu alguns anos na antiga Vila e chamava-se ***, popularmente conhecido por “***”, em razão de fazer parte da antiga Guarda Nacional. Também clinicou aqui outro “dr” chamado *** o qual se intitulava cirurgião e teve consultório no Formigueiro. Eles tinham a audácia de receitar remédios da alopatia, prescrevendo fórmulas de esterrecer os que tinham verdadeiro conhecimento da arte de Galeno. O seu arrojo ia além: colocavam placas na frente do consultório e assinavam receitas, as quais eram impressas como são as dos médicos da atualidade. Uma vez um farmacêutico recusou-se de aviar uma receita do “dr” ***, em virtude de achá-la errada, dizendo que as drogas contidas nela eram em doses elevadas, e de acordo com as indicações, poderia causar séria intoxicação no doente. O pretenso “dr”, tão irritado ficou com isso, que mandou dizer ao boticário que ia à sua presença, porém armado para fazer valer os seus direitos de médico e que sua cabeça seria a depositária das balas de seu revólver.

A famigerada receita constava das seguintes drogas: Arrenal 1,0, arseniato de sódio 0,50, xarope de morfina 20,0, infuso de salsaparilha 100,0. Para tomar uma colher, das de sopa, de hora em hora. Dr. ***. A família da pessoa doente ficou muito revoltada com a atitude descortês do farmacêutico. Outra ocasião esse mesmo “médico” foi chamado para atender a uma senhora que se achava bastante doente. Ele, depois de examiná-la, disse-lhe que o seu mal era porque havia um porco branco no seu quintal , que retirassem o quanto antes esse animal agourento dalí e o levasse para sua casa, a fim de ser consumido misteriosamente. Como era de se esperar, o seu pedido foi imediatamente atendido. O fim que teve o porco, o leitor não deve ignorar… e, a enfêrma seguiu o caminho da Eternidade, porém, a fé que a família no “embusteiro” perdurou por muito tempo.

Isso tudo que havia em nossa terra com relação à medicina, tão mal compreendida pela nossa gente, deu lugar que alguns sepeenses também se arvorassem de um dia para outro em médicos e abrissem desassombradamente os seus consultórios, porque, certamente, clientes não lhe faltariam. Houve um no Cerrito do Ouro que, depois de exercer a profissão de barbeiro, “diplomou-se” em medicina e fez sucesso naquele lugar. Ao mesmo tempo ele, nas horas de ócio (que eram poucas), lia as obras de Alan Kardec; porém interpretando erradamente os seus ensinamentos, se entregava ao baixo espiritismo.

A sua mulher, que tomava parte na seita tinha um grande poder de mediunidade para os ignorantes obsecados por eles. Esse “dr” prescreveu uma receita da seguinte forma: “Para a casa da comadre Ana Corrêa de Camargo. Primeira-mentes ferva 9 folhas de fumo brabo e tome bafo de fumo quente nos pés, dissolva algodão num ouvido e no outro ouvido, tome essas pírulas por mim preparadas, tenha coidado nas cumidas e muita fé em Deus. Fulano de Tal, médico.

Esta reminiscência é com referência aos espertos que ilegalmente exerciam a medicina em nossa terra, e aos que eram explorados por essa gente. Não se pode fazer alusão a alguns sepeenses que, por humanidade aplicavam a homeopatia, não raro, acertadamente, sem conferirem resultado disso. Os bem intencionados compreendiam que, exercer essa profissão com desprendimento, mesmo sem os direitos legais, era a caridade perfeita, a mais perfeita que podia haver. Era o que faziam essas pessoas com êsse pensar. Assim era praticada a medicina e a exploração dos “esculápios” de antanho em São Sepé.