Amor Exigente: há 27 anos acolhe, ampara e auxilia familiares de dependentes químicos em São Sepé

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Por: Pedro Corrêa

 

Carinho, solidariedade, compreensão, acolhimento, ajuda, proteção, garra, empatia, partilha e amor. O grupo Amor Exigente oferece tudo isso a familiares de dependentes químicos há 27 anos em São Sepé.

Fundado em 08 de março de 1995, dia internacional da mulher, o grupo tem como objetivo acolher e amparar familiares de dependentes químicos. A data tão importante para a sociedade, em São Sepé, é, também, símbolo de uma luta diária e constante que as famílias travam contra as drogas.

O jornal O Sepeense decidiu penetrar nesta entidade tão importante. Nesta reportagem especial, conversamos e ouvimos muitas histórias. As identidades serão mantidas em sigilo, por isso, os nomes serão trocados, exceto da coordenadora do projeto, Ramira Gonçalves. Primeiro, porque o sigilo é uma das garantias que o grupo oferece. Segundo, para preservar e respeitar a história de quem conta.

 

AMOR EXIGENTE

A Federação Amor Exigente (FEAE), surgiu no Brasil em 1984. A FEAE enxerga o amor exigente como: Identificador, “humanizador”, protetor, valorizador, libertador, influenciador, preparador, “esperançador”, apoiador, cooperador, organizador e compensador.

Ramira Gonçalves coordena o grupo Amor Exigente de São Sepé desde 2021. A coordenadora assumiu a responsabilidade após o falecimento do dentista e empático com a causa Airton Picada Souto, devido a complicações da covid-19. “É difícil seguir sem ele. É uma responsabilidade imensa, uma saudade gigante e um sentimento de vazio constante”, relata.

Todas as segundas-feiras, às 19h30min, o Salão Paroquial recebe dezenas de pessoas que se reúnem para compartilhar vivências e buscar apoio e conforto com outras pessoas que atravessam dificuldades similares. Mais do que experiências, os membros do grupo trocam atenção, visão e amizade.

 

SOLIDARIEDADE, EMPATIA E AMOR

Por mais que os problemas sejam aparentemente iguais, cada caso é individual. Cada família traz suas dores particulares e abre no círculo para desabafar, aprender e ensinar.
“Quando tem um dependente químico na família, todos adoecem”, fala emocionada Ana, que internou o companheiro recentemente depois de uma recaída. “Ele começou a agir de forma estranha. Depois, o dinheiro passou a sumir, as contas que eram redondas não fechavam mais. Até que eu descobri que ele tinha voltado a usar drogas, depois de mais de 10 anos afastado delas, me senti traída”, conta.

Ana e o companheiro estão juntos há mais de 17 anos. O marido, segundo ela, sempre foi trabalhador e responsável. “Hoje, eu não consigo mais confiar nele, e isso é o que mais dói”, pondera chorando.
Neste momento, ela recebe carinho e empatia de todo grupo.

João, pai de um dependente químico, concorda e alerta que a confiança é um bem que se conquista e não se compra. “Eu sempre tenho os dois pés atrás com meu filho e isso corrói”.

Laura pede a palavra. Em seu relato ela comenta que o filho está em sobriedade há cerca de quatro anos. Mas ela sempre busca maneiras de abordar, perguntar e investigar. “Peço fotos, faço chamada de vídeo, áudio, converso com amigos próximos, estou em alerta constante. E isso vai ser para sempre”, desabafa.

A troca de experiências ajuda quem está chegando a perceber que não está sozinho, e auxilia os demais a lidarem com problemas que aparecem.

Observo enquanto repórter que a garantia do sigilo é fundamental para que todos se sintam confortáveis em expor seus relatos sem medos, julgamentos e preconceitos.

 

A LUTA

A ciência encara a luta contra as drogas como um problema de saúde pública. De acordo com cientistas sociais, especialistas em saúde mental e médicos, a sociedade precisa enxergar o usuário como doente, para poder tratar e recolocar o dependente químico em seu papel social.

Rafael, pai de dependente químico em sobriedade, lembra das dificuldades de reinserir o seu filho depois do período internado. “A sociedade fecha as portas. Encontrar emprego, se colocar no mercado de trabalho está difícil para todo mundo. Para um ex-usuário de drogas, o caminho fica mais complicado ainda”, desabafa.

A demora para buscar ajuda é um fator que corrobora para que o problema se agrave. “O preconceito de vir até aqui se abrir para o grupo é grande. Ainda mais numa cidade pequena, onde todos se conhecem”, explica Ramira. Mas salienta sobre a importância de se despir de julgamentos alheios e buscar auxílio.

 

O GRUPO

Apesar dos encontros serem no Salão Paroquial, o grupo não tem religião. Na reunião, uma mensagem de reflexão é lida, logo após debatida entre os membros. Depois, é hora do acolhimento para os novos integrantes e relatos. É o momento mais íntimo. Choro, emoção, amor, acolhimento e empatia transbordam.

De mãos dadas, em círculo, todos fazem uma oração, a reunião é finalizada com desejos de fortalecimento e melhoras para os membros.

Ramira salienta que o grupo é aberto para todos. Para fazer parte do Amor Exigente de São Sepé, basta comparecer nas reuniões que ocorrem todas as segundas-feiras, às 19h30min, no Salão Paroquial.

Além das reuniões, o grupo também faz ações sociais em comunidades terapêuticas e mutirão de ajuda para familiares que estejam passando por dificuldades.