Alison dos Santos está promovendo uma verdadeira revolução na forma como se corre os 400m com barreiras. Numa temporada quase impecável, em que venceu cinco das seis etapas da Diamond League que disputou, Alison mudou a maneira como se disputa a prova com uma mecânica de corrida absolutamente inovadora, transpondo quatro barreiras consecutivas de forma bilateral, alternando perna esquerda e direita. É também o único atleta que consegue passar por quatro barreiras nos 400m dando apenas 12 passos entre elas, já que é necessário um número par de passos para que os ataques bilaterais sejam possíveis. E é com essa estratégia que ele começa sua busca pelo ouro nas Olimpíadas de Paris 2024 a partir desta segunda-feira (5).
As pernas compridas ajudam. Com 1,98m, Alison é mais alto do que todos os adversários diretos. Só de perna, Piu como é popularmente chamado, tem 1,11m. Mas a altura isoladamente não explica a revolução que ele está causando na prova. Há um trabalho minucioso em torno do talento natural de Piu, que inclui uma equipe multidisciplinar se dedicando para reduzir o número de passos e de centésimos de segundos a cada prova. Só ele ataca quatro barreiras bilateralmente.
Alison venceu a barreira dos 47 segundos pela primeira vez num dia muito especial. Em 3 de agosto de 2021, o atleta conquistou a medalha de bronze nas Olimpíadas de Tóquio ao completar a final olímpica em 46s72. Aos 22 anos, só ficou atrás do americano Rai Benjamin, que fez o tempo de 46s16, e do norueguês Karsten Warholm, que bateu o recorde mundial com 45s94 e se tornou o único homem até hoje a fazer a prova em menos de 46 segundos – feito que nem ele mesmo conseguiu repetir desde então.
Naquela prova, Piu trocou a perna de ataque apenas nas barreiras quatro e cinco. De lá para cá, foi aprimorando sua prova até chegar à bilateralidade nas quatro barreiras atuais, 3, 4, 5 e 6. Alison marcou menos de 47 segundos mais cinco vezes, fazendo o terceiro melhor tempo da história dos 440m com barreira em de 19 de julho 2022, quando se tornou campeão mundial com 46s29, batendo Warholm e Benjamin. Uma lesão no menisco em fevereiro de 2023 o tirou das competições até agosto de 2023.
A partir de maio deste ano, mostrou que está pronto para a briga pelo lugar mais alto do pódio. Tanto que é dono da segunda melhor marca da temporada, os 46s63 da vitória na etapa de Oslo, casa de Warholm – Benjamin fez 46s46 na seletiva olímpica dos Estados Unidos.
Os 400m com barreira estrearam em Olimpíadas em Paris 1900 e fazem parte do programa olímpico desde Estocolmo 1912. Houve, ao longo dos anos, mudanças no número e na altura das barreiras. No formato atual, há 45 metros da largada até a primeira de dez barreiras, dispostas em intervalos de 35 metros entre uma e outra, e mais 40 metros da última até a linha de chegada. O atleta precisa correr e saltar as dez barreiras para completar os 400 metros da prova. É uma das provas mais técnicas do atletismo. Piu costuma completar o percurso com 149 ou 150 passos. Pode haver uma pequena variação no trecho final, entre a última barreira e a linha de chegada, dependendo das condições da prova, especialmente a climática.
As dez barreiras têm 91,4cm de altura, na prova masculina – na feminina, são 76,2cm. Nos primeiros 45 metros, da largada até a primeira barreira, Piu dá 20 passos e salta com a perna esquerda. Entre a primeira e a segunda, que ele também ataca com a perna esquerda na frente, são 13 passos. Nos quatro trechos que vão as segunda até a sexta barreiras, o atleta dá 12 passos e alternas as pernas direita e esquerda. Da sexta barreira para a sétima e daí em diante até a última, volta a dar 13 passos e a atacar só de canhota. E da barreira final até a linha de chegada, são cerca de 16 passos, podendo variar a depender das condições de vento e estratégia de prova. A volta para 13 passos após a sexta barreira acontece para evitar que o corpo do atleta se canse: há uma alta exigência de força horizontal para que ele mantenha os comprimentos das passadas necessários para um menor número de passos.