‘Fui condenado antes de ser réu’, afirma João Luiz Vargas

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Foto: divulgação

 

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Ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), João Luiz Vargas foi absolvido, no dia 31 de janeiro no processo judicial do Caso Rodin. Já na Justiça Federal de Santa Maria, ele tinha sido absolvido da acusação de se beneficiar de dispensa de licitação. Jornalista e advogado, ele ainda responde a uma ação de improbidade administrativa (ressarcimento de valores) sobre o caso.

Dedicado a criar um instituto de direitos e deveres do cidadão focado em questões judiciais, mas também para analisar outros aspectos, como ambientais, João Luiz, de 66 anos, tem dividido o tempo entre Porto Alegre, onde é sócio de um escritório de advocacia, e São Sepé e Santa Maria, aos finais de semana.

Em entrevista ao jornal Diário de Santa Maria concedida após a sua absolvição, ele falou sobre os momentos que enfrentou nesses 11 anos de Rodin, os planos para o futuro e o momento atual do país. Confira os principais trechos:

 

Diário de Santa Maria – Em novembro de 2017, quando a Operação Rodin completou 10 anos, o senhor afirmou em entrevista ao jornal que sua absolvição era inevitável. O que lhe dava certeza da reversão da decisão no TRF4?

João Luiz Vargas – Um dos pontos principais era o convencimento da inocência. O outro foi o trabalho jurídico extraordinário realizado pelo Eduardo Jobim. A dedicação dele, a busca de provas, contraprovas foram importantes para esse deliberado. Esse momento da Operação Rodin, desde 2007, foi, para mim, um momento de aprendizado no campo jurídico e no campo das relações interpessoais. Foi uma experiência fantástica em toda a minha vida e na dos meus familiares e amigos.

 

Diário – Em seu voto, o relator do caso no TRF4, Leandro Paulsen, o absolveu por desvio de recursos públicos, contudo, admitiu a possibilidade de condenação por se beneficiar de dispensa de licitação, caso o MPF tivesse recorrido da sua absolvição em 1º grau, o que não ocorreu.

João Luiz – Eu vou fazer a interpretação do advogado. Ele coloca que isso ia acontecer se realmente fosse provado que eu tivesse tido enriquecimento ilícito. Só o que eu comprei depois que eu fui para o Tribunal de Contas foi uma caminhonete. Foi só o que eu adquiri como advogado, fazendo júri, inventário na minha cidade. Aliás, durante o processo da Rodin, determinada rede de informações queria saber o meu patrimônio e eu divulguei. Não tenho nenhum problema. Imagine o que restou para Porto Alegre, nessa situação do TRF4, apenas o crime de peculato. Mas como eu poderia estar nesse crime, se eu não era um funcionário ligado ao Estado? Não tinha como ter qualquer envolvimento com o Detran. Aliás, quando votei em processo no Detran, o meu voto foi acompanhado pelos outros conselheiros e colocando multas. O Judiciário existe para fazer a análise profunda dos processos.

 

Diário – Por que o senhor acha que foi denunciado pelo Ministério Público Federal? Seria pela proximidade com a família Fernandes, acusada de mentora do esquema, pelas citações do seu nome em áudios dos envolvidos ou por um de seus filhos ser sócio de uma das empresas envolvidas?

João Luiz – Aquele foi um momento político que vivia a cidade, o país. Naquele momento, estava começando toda essa situação de corrupção. Era um momento político muito forte. A Justiça Federal de Santa Maria fazia reuniões, com espaço para a imprensa, onde todos nós fomos já condenados previamente, mesmo antes de sermos réus. Eu fui condenado antes de ser réu. Diziam que todo mundo sabia que o João Luiz era amigo do professor Sarkis (ex-reitor Paulo Sarkis), do professor José Fernandes. Isso nos trouxe essa inclusão, que eu entendo que o Judiciário, no momento, até não tinha como nos excluir. E de todas as acusações que recebi, só restou uma. Nas outras todas, fui absolvido (dispensa de licitação) em Santa Maria, por um juiz daqui e nem foi interposto recurso pelo Ministério Público Federal.

 

Diário – Na época em que a operação foi deflagrada, o senhor era presidente do Tribunal de Contas do Estado, órgão que fiscaliza a aplicação de verba pública, e a Rodin investigava, justamente, desvio de recursos públicos. O senhor acabou se afastando do TCE. Como foi essa situação?

João Luiz – Foi uma situação muito constrangedora para alguém como eu, que começou a vida em São Sepé, como vereador, depois prefeito, etc… Em nenhum desses períodos, eu tive sequer uma observação que pudesse haver uma situação constrangedora. Chego no Tribunal de Contas, estando lá no terceiro ano e foi colocada uma situação extremamente constrangedora. Porque alguém que tinha que julgar a boa aplicação dos recursos públicos estava sendo colocado em dúvida a sua honra, a sua forma de julgamento. Então, foram momentos constrangedores e eu sou muito grato a todos do Tribunal de Contas, que foram fortes em acompanhar as denúncias no sentido de darem todas as informações e em darem segurança a nossos julgamentos.

 

Diário – Ao longo das investigações, o senhor procurou se manifestar nos livros que escreveu sobre a Operação Rodin. Um deles tem como título “A Arte de Destruir Reputações.” Quantos livros o senhor escreveu, e conseguiu recuperar a reputação?

João Luiz – Esse livro tem mais de 200 páginas, ele traz uma situação que eu entendo existente na época, um tanto política também. A nossa universidade e a própria Santa Maria tiveram prejuízos. A reputação de alguém é como você arrancar uma rosa do jardim e deixá-la um determinado tempo fora daquela terra que trazia todas as condições para que aquela planta tivesse uma flor linda. Você só vai conseguir, replantando esse vegetal. E ele levará algum temo para produzir novas flores. Reputação, a gente perde de um dia para o outro, e a recuperação da convicção das pessoas é bastante lenta. Não vamos apressar, vamos ter calma. Para que os meus filhos, para que a minha neta possam dizer: “o meu avô passou por aqui e foi um homem digno, um homem que orgulhou a toda a sua família e todos os seus amigos e eleitores que confiaram nele em muitas eleições”. Esse outro (livro), agora, junta a Rodin e traz também experiências de vida. Então, tudo isso agora me dá a oportunidade de trazer alguns esclarecimentos. Esse livro é um relato de todo esse momento.

 

Diário – No dia da sua absolvição, o senhor agradeceu aos amigos que não o abandonaram. Muitos se afastaram após a Rodin?

João Luiz – Nesse período todo, eu cheguei à seguinte conclusão: eu tenho muitos amigos e aqueles que se afastaram não eram meus amigos. Mas eu continuo com muitos. Eu nunca abandono meus amigos. Não tenho nenhum ressentimento, tenho profunda gratidão, à minha família também. O meu filho, quando se formou, resolveu se formar apenas em gabinete, dada a situação do momento. Já a minha filha se formou e eu fui na colação. E eu me lembro de que, naquela oportunidade, eu entrava no salão da formatura e algumas pessoas olhavam e pensavam: “mas o que é que esse homem, com essa barba, está fazendo aqui?” Hoje, é diferente. Eu tenho saído nas ruas, eu nunca deixei de ter, na minha vida, o andamento que eu sempre tive. Mas eu sentia aquela dificuldade em algumas pessoas. Hoje, pelo contrário. Então, isso me faz muito feliz e muito agradecido ao Judiciário. Parece que ele deu um selo de qualidade à pessoa do João Luiz.

 

Diário – Mas ainda existe uma ação de improbidade administrativa contra o senhor em andamento.

João Luiz – Como é um processo que está em andamento, eu não gostaria de dar a minha opinião. Isso porque a improbidade, hoje, para quem passa pela vida pública, são muitos que passam por esse processo e isso traz prejuízos incansáveis às pessoas. A lei de improbidade foi criada em um momento, onde talvez ela fosse necessária, mas ela tem que ser alterada.

 

Diário – O senhor pretende voltar para política com a absolvição?

João Luiz – Eu venho de um tempo antigo, de um país que vivia uma ditadura e tinha a Arena e o MDB. E eu sempre estive, na época, do lado do MDB. E depois, com o pluripartidarismo, fiquei do lado das minhas convicções brizolistas e trabalhistas. E desde então estou aí. Eu estou vivendo um momento de tanta alegria. As pessoas é que sabem se eu posso voltar. Continuo filiado ao PDT e continuarei até o fim.

 

Diário – E como o senhor avalia o cenário atual em que muitos políticos foram presos, como o ex-presidente Lula e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, condenados por corrupção?

João Luiz – Agora, nesse país, só o que se fala é na situação que envolve pessoas na Lava-Jato. Existe, hoje, uma vontade de um “Brasil passado a limpo”. Parece que o Brasil começa de alguns dias para cá. Mas não, tudo isso está imbricado na história desse país. Não me cabe dizer se são culpados ou não, mas cabe dizer que a emocionalidade está penalizando muitas pessoas, mas o tempo vai trazer o esclarecimento necessário.

 

Diário – E como o senhor vê o cenário político? Nas eleições de 2018, candidatos com bandeiras conservadoras foram vitoriosos nas urnas?

João Luiz – Eu tenho uma posição contrária ao que está acontecendo no Rio Grande, das privatizações (que o governo do Estado pretende fazer). Olhe o fantástico trabalho feito pela Corsan em Santa Maria e na região. A CEEE também faz um trabalho fantástico com o pouco que restou, em um setor importante que é a energia elétrica. A própria CRM é uma espécie de reserva do nosso carvão.

 

Diário – E no Brasil?

João Luiz – E sobre o Brasil, eu não tenho uma posição que possa concordar com o que estou vendo hoje. Eu me lembro de que, mesmo nos governos militares, nós não tínhamos um controle tão forte do Exército como nós temos hoje. Eu não estou dizendo que não são pessoas aptas para a função, mas o número de militares que ocupam os ministérios é exagerado, em detrimento de pessoas das universidades. Nós temos que ter um governo que seja para os brasileiros. Imagine a reforma da Previdência, por exemplo, não será aplicada da mesma forma para os civis e para os militares. Não acontecerá no mesmo momento que acontecerá para os civis, porque se vive à ordem do mito, e quando se teve mitos no mundo, todos não foram bons para a humanidade, eu tenho muito medo do momento que vive o Brasil. Mas espero que tenhamos no nosso país, alguém que possa fazer aquilo que o Dr. Brizola, que nunca se curvou. Imagine se nós tivéssemos a oportunidade de ter tido Brizola como presidente? A educação que nós teríamos nesse país. O grande problema desse país é a educação. No Brasil, a gente se une só na dificuldade. O governo que está lá poderia estar lutando pela educação, mas está preocupado em penalizar os responsáveis, o que também é importante, mas o governo tem que despertar para a educação. Enquanto nós não tivermos educação, nós vamos continuar como estamos. O governo está se preocupando com outras questões, mas não tem projeto de educação. Está na hora de começarmos a questionar.

 

 

 

Fonte: Diário de Santa Maria