Do outro lado da grade: a vida no Presídio Estadual de São Sepé

0
440

_MG_3256-2

*Os nomes dos presos foram alterados para preservar suas identidades

A realidade das casas penitenciárias do país fez com que ao longo do tempo uma porcentagem esmagadora da sociedade criasse um (pré) conceito de que cadeia no Brasil é sinônimo de bandidagem e fomento ao crime. Na contramão destas e de outras definições, iniciativas como as realizadas no Presídio Estadual de São Sepé dão exemplos de como é possível tentar recuperar homens e mulheres que hoje estão impedidos do convívio social. Nossa reportagem foi em busca de histórias e números que ajudam a explicar como as horas passam para quem errou e hoje vê do início ao fim do dia a vida se resumir a uma cela e algumas horas de sol._MG_3252

São 45 homens e quatro mulheres. Este é o número atual da população carcerária do Presídio de São Sepé. O diretor interino, Márcio Cleber Dutra, conta que os desafios são semelhantes aos de outras unidades, mas o porte considerado pequeno do Presídio ajuda no contato diário com os detentos. Em 22 anos de carreira, Márcio já passou por instituições ligadas à segurança em Porto Alegre, Santa Maria, Viamão e Encruzilhada. Com uma equipe composta por 12 funcionários, o convívio com o perigo também não está muito distante dos profissionais. As vistorias nas celas são feitas a partir de cronogramas de um grupo de policiais e agentes da Susepe que percorre cidades da região. Na última, realizada há cerca de quatro meses, foram apreendidos materiais como facas artesanais além de telefones celulares. “Apesar dos registros não são casos expressivos. A situação fica mais desafiadora com medidas como as tomadas recentemente que colocam limites nas revistas íntimas”, explica Dutra.

É nesse ambiente que funcionam oficinas de artesanato e uma fábrica de bolas. As iniciativas que envolvem uma parcela dos presos reduz a pena em um dia para cada três trabalhados. No caso dos artesanatos (a caixa em forma de coração da foto foi produzida por um deles), as famílias ainda tem a possibilidade de vender o material. Todo trabalho é feito com jornais, cola, tinta e verniz. Os materiais são na grande maioria doados por instituições ou empresas parceiras. Na fabricação das bolas o sistema é um pouco diferente: uma empresa de Santa Maria garante a compra dos produtos dando demanda aos objetos e estímulo aos apenados.

_MG_3277-2

O diretor ainda acrescenta que nos últimos meses o grupo tem mostrado mais interesse com os projetos que ainda envolvem os cuidados de uma estufa de alimentos e a manutenção da cozinha.

E é na cozinha que encontramos *Daniel. Preso um dia após o natal de 2013, ele foi detido depois de ser enquadrado na Lei Maria da Penha. No momento do fato, a companheira – que também já esteve presa – entregou à polícia trouxas de cocaína e uma balança de pesagem. Resultado: o homem de 31 anos que trabalhava como taxista contará os dias até a metade de 2016 para ganhar liberdade. *Daniel, que nunca havia respondido criminalmente, ainda revela: “Já tinha feito até concurso para entrar na Susepe e ironicamente hoje estou do outro lado”. O presidiário atualmente está junto da companheira que o denunciou em 2013.

Enquanto *Daniel cozinha, outro homem, de 39 anos, prepara uma bebida. A relação de *Paulo com o Presídio é bem mais duradoura. A primeira prisão aconteceu quando ele mal tinha completado a maior idade. “Se somar os anos entre condicional ou regime fechado, passei a maior parte da vida preso”, conta o acusado de alguns assaltos e roubos à carros, dentre outros crimes. Além dos erros cometidos desde 1994, *Paulo lamenta o preconceito para a reafirmação na sociedade._MG_3281-2

“Não fossem os convênios como os com a Prefeitura, por exemplo, ninguém nos daria uma chance de emprego. Nós erramos, mas o preconceito também é muito grande”, diz o detento que em 2015 deve ganhar uma nova chance de ser livre e provar que está recuperado.

O diretor da casa de detenção conclui lembrando alguns parceiros como o Conselho da Comunidade, coordenado pelo Defensor Público, José Salvador. “Apesar de todos os problemas é preciso assimilar que Presídios como o nosso nos dão a chance de tentar recuperar pelo menos uma parcela dos presidiários”, finaliza Márcio em frente uma sala composta de cadeiras e uma imagem de uma Santa onde são realizados atividades ligadas à religião.